Os tubarões são na sua grande maioria predadores de topo da cadeia alimentar, facto que os torna particularmente sensíveis à bioacumulação. A contaminação presente no ecossistema marinho é maioritariamente derivada da atividade humana e estes contaminantes podem então ser acumulados ao longo da cadeia trófica por espécies de tubarão como a Pata-roxa (Scyliorhinus canicula) e o Tubarão azul (Prionace glauca). O fígado é um dos maiores órgãos nestas espécies, e é composto por diversas classes de lípidos e, por consequência, uma enorme diversidade de ácidos gordos que são, metabólica, estrutural e funcionalmente importantes. O objetivo deste estudo passou por caracterizar os perfis de ácidos gordos no fígado das espécies em estudo, fazendo uma comparação entre espécies, e tentando inferir acerca da influência de fatores biológicos (sexo e estado de maturação) e de fatores abióticos ambientais, nomeadamente acumulação de metais e metaloides, nas alterações dos respetivos perfis. Para isso, os ácidos gordos totais foram extraídos individualmente do fígado de cada individuo de cada espécie e analisados através de cromatografia gasosa, para serem identificados, quantificados e correlacionados com níveis de contaminantes antropogénicos. Os ácidos gordos analisados foram agrupados em: SAT, MUFA, PUFA, HUFA, ω3, ω6, ω7 e ω9. Os resultados mostraram diferentes perfis de ácidos gordos nas duas espécies, sendo que houve diferenças significativas entre espécies para todas as categorias e grupos. A análise demonstrou que a percentagem das diferentes classes de ácidos gordos para cada espécie variou de acordo com os estágios de vida e sexo de ambas as espécies. Através de análises de correspondência canónica (CCA foram encontradas algumas associações entre os elementos químicos avaliados e diversos ácidos gordos, que foram analisados com maior escrutínio através de análises de correlação. Nas correlações efetuadas em P. glauca, houve alguns ácidos gordos cuja variação se correlacionou significativamente com os níveis de vários metais, nomeadamente o 16:1 -trans, 18:2ω6 -trans, 18:2ω6, 22:0, 22:1ω9 e 24:1ω9. Nesta espécie os machos demonstraram correlações maioritariamente positivas entre os níveis de contaminantes e níveis de ácidos gordos, sendo que nas fêmeas foram maioritariamente negativas. Em S. canicula, o CCA mostrou que os elementos que mais influenciaram a variabilidade das respostas foram o Hg, Fe e Zn, sendo que o Fe apresentou correlações significativas com 19 ácidos gordos e o Zn com 10 dos 39 ácidos gordos. As diferenças apresentadas nos perfis de ácidos gordos podem traduzir não só a exposição a diferentes níveis de contaminação por metais que estão dependentes de diferentes hábitos alimentares, localização e migrações das diferentes espécies, mas demonstram estar associadas também aos diferentes estágios de vida e sexos (condições dietéticas e ciclos reprodutivos). Este estudo com as duas espécies de tubarões demonstra o potencial dos ácidos gordos para serem utilizados em estudos para avaliar os efeitos de fatores biológicos e ambientais em organismos costeiros e de águas profundas. Sharks are mostly predators at the top of the food chain, which makes them particularly sensitive to bioaccumulation. The contamination in the marine ecosystem is mostly derived from human activity. These contaminants can then be accumulated along the food chain by shark species such as the Lesser-spotted Dogfish (Scyliorhinus canicula) and the Blue Shark (Prionace glauca). The liver is one of the largest organs in these species and is composed of several classes of lipids and, consequently, an enormous diversity of fatty acids that are metabolically, structurally, and functionally important. The objective of this study was to characterize the fatty acid profiles in the liver of the species under study, make a comparison between species, and try to infer the influence of biological factors (sex and state of maturation) and environmental abiotic factors, namely accumulation of metals and metalloids, in the alterations of the respective profiles. For this, total fatty acids were extracted individually from the liver of each individual of each species and analyzed by gas chromatography, to be identified, quantified, and correlated with levels of anthropogenic contaminants. The fatty acids analyzed were grouped into: SFA, MUFA, PUFA, HUFA, ω3, ω6, ω7, and ω9. The results showed different fatty acid profiles in the two species, with significant differences between species for all categories and groups. The analysis showed that the percentage of the different classes of fatty acids for each species varied according to both species' life stages and sex. Through canonical correspondence analysis (CCA some associations were found between the evaluated chemical elements and several fatty acids, which were analyzed with greater scrutiny through correlation analyses. In the correlations carried out in P. glauca, there were some fatty acids whose variation was correlated significantly with the levels of several metals, namely 16:1 -trans, 18:2ω6 -trans, 18:2ω6, 22:0, 22:1ω9, and 24:1ω9. In this species, males showed mostly positive correlations between the levels of contaminants and fatty acid levels; in females, they were mostly negative. In S. canicula, CCA showed that the elements that most influenced the variability of responses were Hg, Fe, and Zn, with Fe showing significant correlations with 19 fatty acids and Zn with 10 of the 39 fatty acids. The differences presented in the fatty acid profiles may reflect not only the exposure to different levels of contamination by metals that are dependent on different eating habits, location, and migrations of different species, but also demonstrated to be associated with different stages of life and sex (conditions diets and reproductive cycles). This study with both shark species demonstrates the potential for fatty acids to be used in studies to assess the effects of biological and environmental factors on coastal and deep-water organisms.