Esta tese aborda a música de catálogo (conhecida internacionalmente como stock ou library music): faixas musicais compostas especificamente para uma futura utilização em produções audiovisuais, e apresentadas em catálogos sob categorias relativas a géneros musicais, emoções, instrumentação, entre outras. Embora a clientela desta indústria musical se limitasse inicialmente a profissionais do audiovisual, com o desenvolvimento de tecnologias digitais e das plataformas de partilha de vídeo da Web 2.0 afirma-se um novo mercado composto por videógrafos amadores e semiprofissionais. A música de catálogo representa então hoje uma atividade remunerada à qual um número significativo de compositores se dedica, bem como um recurso musical presente numa quantidade importante de audiovisuais. Adotando uma perspetiva interdisciplinar que conta com a sociologia da música nos seus alicerces teórico-metodológicos, proponho identificar as especificidades definidoras da música de catálogo, procurando compreender os padrões e convenções que fazem dela um mundo artístico próprio. Para explorar esta questão, parto de uma amostra de catálogos europeus e norte-americanos ativos nos últimos vinte anos. Com base em entrevistas a compositores e utilizadores de música de catálogo, bem como na análise de materiais publicitários e didáticos online a eles dirigidos, coloco em diálogo os pontos de vista de diversos agentes que interagem com esta música ao longo da sua produção, categorização ou utilização. O cruzamento de testemunhos de compositores situados em diferentes pontos do espectro desta indústria musical revela uma experiência heterogénea e multifacetada, complexificando assim retratos simplistas que predominam sobre a música de catálogo. Destaco também a relevância de examinar a música de catálogo como resultado da ação conjunta de indivíduos que intervêm de forma decisiva nos potenciais significados de uma faixa, seja através da sua etiquetagem, da sua alteração ou da sua inserção em novos contextos audiovisuais. Atender às perspetivas destes agentes permite demonstrar a importância do propósito de funcionalidade na música de catálogo: o facto de ser desde a sua génese concebida como música funcional destinada a audiovisuais é uma particularidade que governa não só as suas características sonoras como todo o seu percurso, desde a sua composição, categorização e promoção à sua modificação e articulação com imagens. Esse estatuto assumidamente utilitário constitui uma das propriedades específicas mais centrais à música de catálogo a partir da sua emergência na primeira metade do século XX. Desde então, esta age como um repositório das tendências e estereótipos musicais que marcam a produção cinematográfica e televisiva em determinado momento. Nesse sentido, os catálogos refletem e simultaneamente reforçam associações tipificadas entre música, imagens e narrativas que integram um vocabulário cultural amplamente partilhado. Para além de discernir velhos hábitos que se mantêm na produção e uso desta música, realço também novas dinâmicas e critérios que surgiram neste mundo artístico com a expansão de formatos digitais e da Web 2.0. Salienta-se nomeadamente a procura por faixas que possam ser desmontadas e rearranjadas o mais possível. Identifico assim um entendimento crescente da música de catálogo como uma matéria-prima que se encontraria incompleta até ao momento da sua transformação por outros agentes que não os seus compositores. This thesis focuses on library music (also known as stock or production music): tracks that are specifically composed for future use in audiovisual media, and categorized in catalogues according to musical genre, mood, instrumentation, among other possibilities. Although the client base of this music industry was initially limited to professional audiovisual creators, the growth of digital technologies and of Web 2.0’s video sharing platforms fostered a new market of amateur and semiprofessional videographers. Today, library music represents a source of income for a significant number of composers, as well as a musical resource extensively used in audiovisual productions. Departing from an interdisciplinary angle that counts the sociology of music as one of its theoretical and methodological foundations, I identify the essential specificities of library music, seeking a deeper understanding of the patterns and conventions that define it as a distinct art world. To examine this question, I focus on a sample of European and North-American libraries active in the last twenty years. Drawing from interviews to library music composers and users, as well as from an analysis of online promotional and instructional materials that address them, I inquire into the perspectives of various agents who interact with library music during its production, categorisation or usage. Observing the activity of composers who engage in a wide range of practices in this industry reveals their heterogeneous and multifaceted experience, emphasizing the need to move beyond the overly simplistic image of library music that is still prevalent today. I also stress the relevance of understanding this music as resulting from the joint action of individuals who intervene decisively in the possible meanings of a track, be it with its tagging, editing or inclusion in new audiovisual contexts. Comparing the discourses and viewpoints of these agents allows us to demonstrate the vital importance of the functional purpose that underlies library music: the fact that it is from the start conceived as functional music for media governs its sonic characteristics and composition, as well as its categorisation, promotion, modification and synchronisation with images. Library music’s explicitly utilitarian status has been central to its definition since its beginnings in the first half of the twentieth century. Since then, library music has acted as a repository of musical formulas that were commonplace in film and television productions in given moments. In that respect, libraries both reflect and simultaneously reinforce stereotyped associations between music, visuals and narratives that are part of a widely shared cultural vocabulary. In addition to ascertaining old habits that endure to the present day in the production and use of library music, I also shed light on new dynamics and criteria that have emerged in this art world with the expansion of digital formats and Web 2.0. Among these, I highlight the demand for tracks that can be deconstructed and rearranged as much as possible. I thus identify a growing understanding of library music as a raw material that is considered incomplete until its transformation and use by agents other than its composers.