A definição básica de pseudotradução é: um texto apresentado como tradução, mas que, na verdade, é um texto original. Nela, um tradutor imaginário afirma estar traduzindo uma obra inexistente: tanto tradutor como obra são produtos de ficção. Um recurso utilizado há muitos séculos de diversas maneiras e com diferentes motivações, ela é, muitas vezes, considerada farsa, fraude, falsificação ou mesmo mero gracejo narrativo sem grandes consequências. Entretanto, ao contrário do que essa visão simplória pode sugerir, ela tem estado presente em momentos importantes da história ocidental. Em sua relação com a literatura, a pseudotradução tem sido utilizada ao longo dos séculos como um poderoso recurso narrativo na composição de obras que concorreram para a transformação de sistemas culturais e literários. A partir da perspectiva do potencial criador e transformador da pseudotradução, este trabalho apresenta cinco obras produzidas em diferentes épocas da história ocidental, as quais, de alguma maneira, contribuíram para a dinâmica dos sistemas literários de suas épocas. Em todas elas, o fato de terem sido concebidas como pseudotraduções foi elemento fundamental e decisivo para seus efeitos. Cada uma dessas obras, distribuídas em períodos pontuais entre os séculos XII e XX, utilizou o recurso da pseudotradução de maneira diferente; todavia, todas elas promoveram transformações de paradigmas literários e questionamentos sobre questões humanas e sobre a própria ficção. São elas: The History of the Kings of Britain, de Geoffrey of Monmouth, século XII; Don Quijote de la Mancha, de Miguel de Cervantes, século XVII; O castelo de Otranto, de Horace Walpole, século XVIII; O nome da rosa, de Umberto Eco, e o conto Tlön, Uqbar, Orbis Tertius, de Jorge Luis Borges, ambas produções do século XX. A observação dessas obras desde a perspectiva do uso da pseudotradução permite considerar a tradução além do processo de versão de uma língua para outra, como processo de escritura per se. The basic definition of pseudotranslation is: a text introduced as a translation, but that is actually an original text. In this process, an imaginary translator claims to be translating a work that does not exist: both translator and work are products of fiction. A resource used for centuries in different ways and for various reasons, it has been frequently considered as sham, fraud, fakery, or even sheer witticism without serious consequences. However, instead of what this naïve view may suggest, it has been present in important moments of western history. As far as its connection to literature is concerned, pseudotranslation has been used along the centuries as a powerful narrative resource in the composition of works that contributed to the transformation of cultural and literary systems. From the perspective of the creative and transformative potential of pseudotranslation, this study introduces five works written in different periods of western history, which somehow contributed to the dynamics of the literary systems of their ages. In all of them, the fact of having been conceived as pseudotranslations was fundamental and decisive for their effects. Each of them, set on determinate periods between the 12th and the 20th centuries, applied the resource of pseudotranslation in a different way; even though, all of them fostered transformations in literary paradigms and questionings around human issues and around fiction itself. Such works are: The History of the Kings of Britain, by Geoffrey of Monmouth, 12th century; Don Quijote de la Mancha, by Miguel de Cervantes, 17th century; The Castle of Otranto, by Horace Walpole, 18th century; The Name of the Rose, by Umberto Eco, and the short story Tlön, Uqbar, Orbis Tertius, by Jorge Luis Borges, both written in the 20th century. Pondering these works from the perspective of their use of pseudotranslation makes it possible to consider translation beyond the process of turning texts from one language into another, as a creative writing process in itself.