RESUMOAo serem desconsideradas como cidadãs, as pessoas em situação de rua parecem ser invisíveis no que diz respeito aos seus direitos, enquanto que no cotidiano a presença delas causa incômodo, gerando o inverso da invisibilidade. Este trabalho, ao empreender o turismo como um direito social, descreve como decorreram as experiências turísticas de um grupo de pessoas em situação de rua - atendidas por um órgão público de assistência social, em parceria com um programa de extensão da Universidade Federal Fluminense -, que visitou atrativos turísticos da região metropolitana do Rio de Janeiro. Além do contato com autores/pesquisas que se debruçaram sobre a realidade das pessoas em situação de rua, o embasamento teórico entrelaçou os temas do Direito ao Lazer e à Cidade, da Experiência Turística e do Turismo Social. As análises realizadas a partir de bases etnográficas, incluindo a observação participante e entrevistas com roteiro semiestruturado, indicaram que as experiências turísticas parecem ter despertado memórias afetivas que funcionam para esse grupo como meio de resistência à condição na qual se encontram. Ainda assim, algumas experiências foram atravessadas por situações graves de preconceito e discriminação, direcionadas por visitantes convencionais ao grupo.PALAVRAS-CHAVETurismo Social; Direito ao Lazer; População em Situação de Rua; Rio de Janeiro, RJ, Brasil. ABSTRACTWhen they are disregarded as citizens, people on the street seem to be invisible with regard to their rights, while in their daily lives their presence causes discomfort, generating the inverse of invisibility. This work, when undertaking tourism as a social right, describes how the tourist experiences of a group of homeless people - assisted by a public social assistance agency, in partnership with a UFF extension program - took place, which they visited tourist attractions in the metropolitan region of Rio. In addition to contact with authors / research that dealt with the reality of people living on the streets, the theoretical basis intertwined the themes of the Right to Leisure and the City, the Tourist Experience and Social Tourism. The analyzes carried out from ethnographic bases, including participant observation and interviews with a semi-structured script, indicated that tourist experiences seem to have aroused affective memories that work for this group as a means of resistance to the condition in which they find themselves. Even so, some experiences were crossed by serious situations of prejudice and discrimination, directed by conventional visitors to the group.KEYWORDSSocial Tourism; Right to Leisure; Homeless Population; Rio de Janeiro, RJ, Brazil. AUTORIAJordania de Oliveira Eugenio – Doutoranda. Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Estudos do Lazer, Universidade Federal de Minas Gerais, Minas Gerais, Brasil. Currículo: http://lattes.cnpq.br/6752199442222274 E-mail: jordaniaeugenio@ufmg.br Bernardo Lazary Cheibub – Doutor. Professor na Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. Currículo: http://lattes.cnpq.br/3403295501230221 E-mail: bernardocheibubu@id.uff.br REFERÊNCIASAndré. M. (2005). Etnografia da prática escolar. São Paulo: Papirus. Alves, V. F.N., Miranda Júnior, M. C., & Martins, R. D. (12 a 15 de setembro de 2004). Turismo e Lazer: em Busca da Cidadania e da Inclusão Social. 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