Introdução: O Relatório Mundial sobre Deficiência estima que mais de um bilhão de pessoas no mundo, 15% da população, convive com alguma forma de deficiência, seja transitória ou permanente, e com elevada vulnerabilidade em saúde. No Brasil, a prevalência varia de 1,5% a 23,9%, dependendo da população investigada e dos critérios adotados para a definição da deficiência. Esta prevalência deve aumentar nos próximos anos pelo envelhecimento populacional acelerado e pela gravidade das doenças crônico-degenerativas. Tal fato tem repercutido de forma a crescer o interesse acadêmico nos estudos sobre a população com deficiência. Objetivo: Estimar a prevalência da deficiência na população de um grande centro urbano e verificar sua associação com as características sociodemográficas e de saúde, estratificada por sexo (Artigo 1), e investigar a associação da prevalência da deficiência com a posição socioeconômica e morbidade (Artigo 2). Métodos: Os dados foram provenientes do inquérito domiciliar de base populacional Saúde em Beagá, conduzido pelo Observatório de Saúde Urbana em dois dos nove distritos sanitários de Belo Horizonte: Oeste e Barreiro, entre 2008 e 2009. A amostragem foi probabilística, estratificada por conglomerados em três estágios: setor censitário, domicílio e indivíduos. A amostra foi constituída por 4.048 indivíduos com idade 18 anos. A variável resposta foi deficiência (DEF), definida a partir do autorrelato de problema nas funções ou nas estruturas do corpo, operacionalizada por meio da pergunta: O (A) senhor (a) tem alguma limitação, dificuldade ou deficiência (seja motora, visual, auditiva ou outras). As variáveis explicativas foram: sexo, idade, cor de pele, estado civil, renda familiar, escolaridade do entrevistado, morbidade autorreferida, autoavaliação de saúde, qualidade de vida e satisfação com a vida (Artigo 1), além do índice de posição socioeconômica que incluiu variáveis de escolaridade materna, do entrevistado, renda familiar e morbidade referida (Artigo 2). Na análise de dados foram utilizadas as seguintes análises: univariada (teste 2 e teste de Wald ajustado, este último para comparação entre sexos), e multivariada pelo algoritmo CHAID (Chi-square Automatic Interaction Detector) para identificar os fatores associados à DEF (Artigo 1). Empregou-se análise fatorial por componentes principais para avaliar a composição do índice de posição socioeconômica e o odds ratio para avaliar a magnitude da associação entre as variáveis respostas e a variável explicativa, utilizando a análise de regressão logística e considerando o desenho amostral (Artigo 2). Resultados: Dos 4.048 indivíduos entrevistados, a idade média foi 40,9 (± 16,1) anos, sendo a maioria do sexo feminino (53,1%). A prevalência da DEF foi 10,4% (IC 95%: 9,1-11,7%), sendo maior no sexo feminino (11,9%; IC 95%: 10,2-13,6) quando comparada ao sexo masculino (8,7%; IC 95%: 6,8-10,5) (valor-p = 0,011). Na análise univariada, todas as variáveis se mostraram associadas à DEF, exceto renda familiar (valor-p = 0,256) e satisfação com a vida (valor-p = 0,407) para o sexo masculino, e cor de pele para ambos os sexos. Na comparação entre os sexos, houve maior prevalência da DEF em mulheres de cor de pele não branca, separadas, desquitadas e viúvas, escolaridade acima de 12 anos, com melhor autoavaliação de saúde e qualidade de vida, do que em homens nas mesmas características. Na análise multivariada, as variáveis que melhor discriminaram a DEF para as mulheres foram a idade e a morbidade referida, e para os homens foi a escolaridade e a autoavaliação de saúde (Artigo1). O autorrelato de deficiência associou-se à idade (OR = 1,02; IC95%:1,01;1,03), ao relato de duas ou mais doenças (OR = 3,24; 2,16-4,86) e ao índice da posição socioeconômica (OR = 0,96; IC95%:0,95-0,97) (Artigo 2). Conclusão: Os resultados sugerem necessidades de condutas distintas para mulheres e homens com deficiência, sendo as mulheres mais vulneráveis segundo características de saúde, e os homens segundo características socioeconômicas. A pior posição socioeconômica parece contribuir para a ocorrência de deficiência. Esses resultados reforçam a necessidade de implementação de programas educacionais e de capacitação profissional, assim como a necessidade de políticas públicas de saúde efetivas para redução das iniquidades em saúde entre as pessoas com deficiência. Introduction: The World Report on disability estimate that over one billion people worldwide, 15% of the population live with some form of impairment, whether temporary or permanent and high vulnerability to health. In Brazil, the prevalence ranges from 2.8% to 24% depending on the population studied and the criteria used for the definition of impairment. This prevalence is expected to increase in the coming years by rapid population aging and the severity of chronic degenerative diseases. This fact has reflected in the growing academic interest in studies on people with disabilities. Objective: Investigate the prevalence of impairment in the population of a large urban center and its association with sociodemographic and health characteristics, stratified by sex (Article 1), and to estimate whether the low socioeconomic position and higher frequency of diseases are associated with a higher prevalence of self-reported impairment (Article 2). Methods: Data were obtained from a population-based household survey named The BH Health Study conducted by the Urban Health Observatory in two of the nine health districts of Belo Horizonte: Oeste and Barreiro between 2008 and 2009. The sample was probabilistic, stratified by conglomerates in three stages: census tracts, households and individuals. The sample consisted of 4,048 individuals aged 18 years. The response variable was impairment (IMP), defined from the self-reported problems in the functions or structure of the body, it was operationalized by the question: Mr(s) do you have any limitation, difficulty or impairment (either motor, visual, hearing or other). The explanatory variables were gender, age, skin color, marital status, family income, the respondent's education, self-reported morbidity, health self-assessment, quality of life and satisfaction with life (Article 1), and socioeconomic position status index that included maternal education variables of the respondent and family income and morbidity (Article 2). In the data analysis were used varied univariate (2 test and Wald test adjusted for comparison between sex) and multivariate by CHAID (Chi-square Automatic Interaction Detector) algorithm to identify the factors associated with IMP (Article 1). Was used factor analysis by principal components to assess the composition of socioeconomic position index and the odds ratio to assess the magnitude of the association between the study variables and the explanatory variable using logistic regression analysis considering the sample design (Article 2). Results: Between the 4,048 interviewed individuals, the average age was 40.9 (± 16.1) years, and the majority of women (53.1%). The prevalence of impairment was 10.4% (95% CI: 9.1 to 11.7%), higher in females (11.9%; 95% CI: 10.2 to 13.6) compared to males (8.7%; 95% CI: 6.8 to 10.5) (p-value = 0.011). In univariate analysis, all variables were associated with IMP, except family income (p-value = 0.256) and life satisfaction (p-value = 0.407) for males and skin color for both sexes. Comparing the sexes there was a higher prevalence of impairment for women of non-white skin color, separate marital status, legally separated and widowed, education over 12 years, better self-reported health and quality of life when compared to men with the same characteristics. In multivariate analysis, the variable that best discriminated impairment for women was age and morbidity and for men was education and health self-assessment (Article 1), the self-reported impairment age was associated (OR = 1.02; 95% CI: 1.01, 1.03) to the account of two or more disease (OR = 3.24; 2.16 to 4.86) and the index of socioeconomic status (OR = 0.96; 95% CI: .95 to .97) (Article 2). Conclusion: The results suggest different behaviors between women and men with impairment, the most vulnerable women according to health characteristics and men according to socioeconomic characteristics. The low socioeconomic status appears to contribute to the occurrence of impairment. These results reinforce the need to implement educational programs and professional training, as well as the need for effective public health policies to reduce health inequities among people with disabilities.