Dissertação de mestrado em Bioquímica, apresentado à Faculdade de Ciências a Universidade de Lisboa, 2019 Co-orientadora Luísa Romão, Departamento de Saúde Ambiental do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge Translation of mRNA into protein is one of the most important and costly processes of the cell, since it supports and regulates several cellular events. Under normal conditions, translation initiation takes place through the canonical mechanism, in which first occurs the recognition of the cap structure at the 5'end of the transcript, followed by the scan of the 5'UTR (untranslated region) until the identification of the initiation codon in a favourable context. However, during high energy cost cell events, such as mitosis, or during some stresses such as hypoxia, mechanisms are activated that decrease canonical translation. Thus, under conditions of inhibition of canonical translation, there are proteins whose synthesis is not affected and is maintained by alternative mechanisms. These include those in which ribosomal recruitment occurs without cap recognition and/or 5'UTR scanning. In these cases, ribosomal recruitment occurs through secondary structures present in mRNA 5'UTR, which interact with the 40S ribosomal subunit, and with or without the help of initiation factors, position it near to the initiation codon. Therefore, it was hypothesized that Argonaute proteins, more properly AGO1 (human Argonaute RNA-induced silencing complex catalytic component 1) could be translated by non-canonical mechanisms due to its importance in the biogenesis of the microRNAs and in the gene silencing. Previous results obtained in our laboratory using a bicistronic system, demonstrated that AGO1 5'UTR is able to mediate cap-independent translation of a reporter gene, even under stress conditions that inhibit canonical translation. Thus, the purpose of this work was to complete this research project, continuing to study the cap-independent translation mediated by the 5'UTR of AGO1. In this way, the first objective was to reinforce the previously obtained results. For this it was intended to show that the AGO1 5´UTR can mediate an alternative initiation mechanism in a bicistronic vector different from the one previously used. For this, the proposed bicistronic system contains two reporter genes, one corresponding to enhanced green fluorescent protein (EGFP) and another corresponding to a red fluorescent protein (mCherry). The characteristic of this system is that in the first cistron is the sequence of EGFP, which is translated by the canonical mechanism. The second cistron is the mCherry sequence that can only be translated in cap-independent manner. With this in mind, the strategy was to clone the sequence corresponding to AGO1 5´UTR, upstream of the mCherry and to verify if it was able to potentiate cap-independent translation of this fluorophore. In this thesis we present the cloning strategy developed to obtain this construct, although we were not able to complete this task. However, we present some possible solutions to complete these clonings. Other objective was to evaluate how the expression of Argonaute proteins, more properly the endogenous AGO1, varies during endoplasmic reticulum stress, which inhibits the canonical translation. For this purpose, we treated HCT116 cells (colorectal cancer-derived cell line) with thapsigargin, which is a drug that induces the stress of the endoplasmic reticulum and, consequently, the inhibition of the canonical translation. Our results demonstrated that treatment with the drug induces a decrease in the AGO1 and AGO2 mRNA levels, a decrease in the total protein amount of Argonautes (AGO1, AGO2, AGO3 and AGO4) and a decrease in the AGO1 protein. In a way, this is an inconclusive result for the study of non-canonical translation of this protein during stress conditions. However, we think that this result is mainly due to two factors. One has to do with the fact that the treatment with the drug decreases the AGO1 mRNA level, thus having less transcript available for translation, which may lead to less protein synthesis, albeit in an alternative way. The other factor is related to the possibility that the non-canonical translation mechanism is not as efficient in as the canonical way, which explains the observed decrease. Thus, in future experiments it will be important to test other stresses that inhibit canonical translation, but that do not induce changes in the amount of mRNA and test this experiment in other cell lines. Finally, we aim to predict what structural features make the AGO1 5´UTR succeed in promoting a non-canonical translation initiation mechanism and thus try to estimate the secondary structure adopted by this sequence. For this we submited AGO1 5'UTR sequence to an in silico analysis. Among other characteristics, we found that it has a percentage of guanines/cytosines of 72.3% and it is organized into a stable secondary structure, which has four stem loops. As a future perspective, we aim to experimentally validate this structural prediction through circular dichroism. Next was performed an in silico deletion analysis in which nucleotides were removed from the sequence in order to predict the structural dynamics and to check if there was any minimal sequence/structure required to maintain stable the spatial conformation of AGO1 5'UTR. By our analysis it was verified that when stem loop I or stem loop IV is removed, the structure does not seem to change much in relation to the original, indicating that the conformation remains stable when small deletions occur. To complement this in silico deletion analysis it is intended in the future to validate experimentally, in a bicistronic vector, the effect of this deletions. We believe that once these research lines have been completed, we will better understand the relevance of alternative translation mechanisms in the maintenance of synthesis of several proteins, including AGO1, during stress situations, and even during the tumorigenesis process. A expressão génica é um processo a partir do qual a informação genética contida no ácido desoxirribonucleico (DNA, do inglês deoxyribonucleic acid) é descodificada em proteínas que serão usadas pelos sistemas biológicos, para a sua sobrevivência, manutenção ou desenvolvimento. Esta é dividida em várias etapas, sendo que tudo se inicia no núcleo com a transcrição da informação contida no DNA em moléculas de ácido ribonucleico mensageiro (mRNA, do inglês messenger ribonucleic acid). À medida que vão sendo sintetizadas, as moléculas de mRNA sofrem um processamento, em que serão introduzidas modificações que serão importantes para estabilidade do transcrito e para as etapas a jusante. Entre estas modificações estão a introdução da estrutura cap m7G na extremidade 5´ do transcrito, a poliadenilaçao da extremidade 3´ e o splicing do mRNA. Uma vez processado, o mRNA maduro será transportado do núcleo para o citoplasma, onde será traduzido para proteína. Em condições normais, o mRNA de eucariotas é traduzido de uma forma canónica, em que inicialmente é necessário que exista o reconhecimento da estrutura cap na extremidade 5´ do transcrito. Desta forma, a tradução inicia-se com o recrutamento da subunidade ribossomal 40S e de fatores de iniciação (eIF, do inglês eukaryotic initiation factor) para a extremidade 5´ do mRNA, sendo que será este complexo, pela ação do eIF4E que reconhecerá o cap. Uma vez ligados, a subunidade ribossomal inicia o scan da região 5´ não codificante (UTR, do inglês untranslated region) até encontrar um codão de iniciação em contexto favorável. De seguida, dar-se-á a síntese da proteína que, terminada, a tradução será utilizada para o funcionamento celular. Contudo durante alguns processos energeticamente dispendiosos para a célula, como a mitose, ou em condições de stress, como a hipoxia, a tradução canónica é afetada. Isto ocorre porque muitas vezes estes estímulos provocam a inibição do reconhecimento da estrutura cap, comprometendo assim a iniciação da tradução. No entanto, existem mRNAs eucariotas cuja expressão não é comprometida aquando destes eventos, sendo que estes transcritos normalmente codificam para proteínas fundamentais para a célula ou de resposta a stress. Desta forma em condições de inibição da tradução canónica, existem proteínas cuja síntese não é afetada, sendo mantida por mecanismos alternativos. Entre estes estão incluídos aqueles em que ocorre o recrutamento ribossomal para o mRNA sem que haja o reconhecimento do cap e/ou scan da 5´UTR. Nestes casos, o recrutamento ribossomal ocorre através de estruturas secundárias presentes na 5´UTR do mRNA, que interagem com o ribossoma, e com o auxílio ou não de fatores proteicos, posicionam este junto do codão de iniciação. Em eucariotas já foram descritos vários mRNAs cuja tradução é mantida em condições de inibição da tradução canónica, sendo os mecanismos alternativos ativados por vários tipos de stress como a hipoxia, a limitação de nutrientes ou a apoptose. Assim, os mecanismos alternativos de iniciação da tradução têm um papel importante para a manutenção da homeostasia celular durante situações de stress. Em sentido contrário estes também podem ter um papel negativo, nomeadamente na promoção do processo de tumorigénese. Geralmente os ambientes tumorais apresentam hipoxia e limitação de nutrientes, que são condições que inibem a tradução canónica e promovem mecanismos alternativos de síntese proteica. Deste modo, as células cancerígenas têm uma vantagem, pois podem manter a síntese de vários oncogenes de uma maneira não-canónica. No nosso trabalho, colocou-se a hipótese de que as proteínas Argonaute, mais propriamente a AGO1 (do inglês human Argonaute RNA-induced silencing complex catalytic component 1) poderiam ser traduzidas por mecanismos não-canónicos em condições de inibição da iniciação da tradução dependente do reconhecimento do cap. Estas proteínas estão envolvidas na síntese dos miRNAs e no silenciamento génico, que por sua vez participam na resposta a alguns stresses e na manutenção do funcionamento celular. Assim, devido à sua importância propôs-se que a síntese da AGO1 possa ser mantida durante condições de stress celular por um mecanismo não-canónico. Resultados anteriores obtidos no nosso laboratório utilizando um vetor bicistrónico, demonstraram que a sequência correspondente à 5´UTR do mRNA da AGO1 é capaz de mediar a tradução independente da estrutura cap de um gene repórter. Também se verificou que esta atividade da 5´UTR da AGO1 é mantida tanto em condições normais, como em condições de stress celular que inibem a tradução canónica, como o stress do reticulo endoplasmático ou a hipoxia. Assim o propósito deste trabalho foi prosseguir nesta linha de investigação, continuando a estudar a tradução independente da estrutura cap mediada pela 5´UTR da AGO1. Desta forma, o primeiro objetivo foi reforçar os resultados obtidos anteriormente, pretendendo-se mostrar que a 5´UTR da AGO1 medeia um mecanismo de iniciação de tradução alternativo, num vetor bicistrónico diferente do utilizado anteriormente. Para isso o sistema bicistrónico utilizado contem dois genes repórteres, um correspondente à proteína fluorescente verde (EGFP, do inglês enhanced green fluorescent protein) e outro correspondente a uma proteína fluorescente vermelha (mCherry). A característica deste sistema é que no primeiro cistrão está a sequência da EGFP, que é traduzida de uma forma dependente da estrutura cap, ou seja, tradução canónica, enquanto que no segundo cistrão está a sequência do mCherry, que a ser traduzida, será duma forma independente da estrutura cap. Entre os dois cistrões está clonado um hairpin, de modo a prevenir a reiniciação da tradução. Tendo isto em mente, a estratégia foi clonar a sequencia correspondente à 5´UTR da AGO1 a montante do mCherry e verificar se esta conseguia potenciar a iniciação da tradução independente da estrutura cap. Nesta tese apresentamos a estratégia de clonagem desenvolvida para obter este constructo, ainda que sem sucesso aquando do término dos trabalhos. Contudo apresentamos algumas possíveis soluções para completar estas clonagens. Outro objetivo desta tese foi avaliar como varia a expressão das proteínas Argonaute, mais propriamente da AGO1 endógena, durante um stress que inibe a tradução canónica. A abordagem experimental foi tratar células HCT116 (linha celular derivada de cancro colorretal) com tapsigargina, que é uma droga que induz o stress do reticulo endoplasmático e, por consequência, a inibição da tradução canónica. Posteriormente foram analisados os efeitos do tratamento com esta droga nos níveis de mRNA das quatro Argonautes (AGO1, AGO2, AGO3 e AGO4), no nível de proteína do pool total de AGOs e no nível de proteína de AGO1. Os resultados obtidos demonstram que o tratamento com a tapsigargina induz uma diminuição nos níveis de mRNA da AGO1 e AGO2 para 54% e 62%, respetivamente. Um resultado que nós acreditamos ser uma consequência indireta da inibição da tradução induzida pela droga. Isto é, ao bloquear-se um processo tão determinante como a tradução, poderão ser afetados indiretamente outros processos celulares. Neste caso, parece indicar que a inibição da tradução canónica afeta a disponibilidade de dois transcritos, o da AGO1 e o da AGO2. Adicionalmente, verificou-se que o tratamento com esta droga afeta a quantidade total de proteínas Argonaute, uma vez que se observa a diminuição do pool de AGOs. Neste caso este resultado dever-se-á ao facto do tratamento com a tapsigargina induzir a diminuição dos níveis de mRNA da AGO1 e AGO2, fazendo com que haja menos transcrito disponível para a síntese destas proteínas. Com a expectável diminuição da quantidade de proteína AGO1 e AGO2, a consequência é a diminuição do pool de todas as AGOs. Finalmente, verificamos que o tratamento com a tapsigargina provoca a diminuição dos níveis proteicos de AGO1 endógena. De certa forma, este é um resultado inconclusivo para o estudo da tradução não-canónico desta proteína durante condições de stress. No entanto, pensamos que este resultado se deve principalmente a dois fatores. Um tem a ver com facto de o tratamento com a droga fazer diminuir o mRNA da AGO1, havendo por isso menos transcrito disponível para a tradução, o que poderá levar a uma menor síntese de proteína, mesmo que de uma forma alternativa. O outro fator está relacionado com a possibilidade de que o mecanismo de tradução não-canónico não ser tão eficiente como a via canónica, o que explica o decréscimo observado. Assim, em experiências futuras será importante testar outros tipos de stresses que inibam a tradução canónica, mas que não provoquem alterações na quantidade de mRNA e testar outras linhas celulares. Para além disso dever-se-á testar alguns stresses, que induzam maior atividade da 5´UTR da AGO1, em termos de síntese proteica. Por fim, o terceiro objetivo deste trabalho foi tentar prever quais as características estruturais que fazem com que a 5´UTR da AGO1 consiga promover um mecanismo não-canónico de iniciação da tradução. Desta forma tentar-se-ia aproximar a estrutura secundária adotada por esta região. Para isso fez-se uma análise in silico à sequência correspondente à 5´UTR da AGO1. Verificou-se que esta tem um comprimento de 213 nucleótidos, apresenta uma upstream ORF (do inglês open reading frame) e tem uma percentagem de guaninas/citosinas correspondente a 72.3%. Especialmente devido a este último fator a 5´UTR da AGO1 tem tendência a organizar-se numa estrutura secundária estável, que possui quatro stem loops. Como perspetiva futura, temos como objetivo validar experimentalmente esta previsão estrutural, através de dicroísmo circular. Posteriormente, fizemos uma análise delecional in silico, de modo a prever a dinâmica estrutural e verificar se havia alguma sequência/estrutura mínima necessária para manter a conformação espacial da 5´UTR da AGO1 estável. Para isso removeu-se, sequencialmente nucleótidos da 5´UTR da AGO1, tanto no sentido 5´ para 3´ como no sentido 3´ para 5´, e verificou-se qual o impacto que isso teria na estrutura da região comparativamente à estrutura com todo o comprimento. Pela nossa análise verificou-se que quando é removido o stem loop I ou o stem loop IV, a estrutura não parece alterar-se muito em relação à original, indicado que a conformação se mantém estável quando ocorrem pequenas deleções. Para complementar esta análise in silico, pretende-se no futuro validar experimentalmente estas previsões. Isto é verificar se a estrutura real adotada pela 5´UTR da AGO1 é semelhante à prevista computacionalmente, e analisar quais os efeitos de deleções na atividade desta sequência para mediar um mecanismo de tradução não-canónico, utilizando um vetor bicistrónico. Uma vez concluídas todas estas linhas de investigação pretender-se-á perceber de que forma é que o mecanismo de tradução alternativa de AGO1 pode estar envolvido no processo de tumorigénese. N/A