Tese de doutoramento em Estudos da Criança (Especialização em Sociologia da Infância), O movimento de reconceptualização da criança e da infância, o mediatismo de alguns acontecimentos, a nova organização judiciária, a especialização de competências e uma justiça que se pretende amigável/sensível é reflexo de uma abordagem renovada, com vista a uma efetiva e afetiva afirmação do discurso promotor dos direitos da criança e das suas capacidades - como presença, como afirmação, como competência, como autonomia. A construção social em torno da imagem da criança, o excessivo protecionismo, o confronto de direitos que pode gerar ou os custos em que se traduz tem constituído obstáculos nessa asserção. Simultaneamente, os espaços da justiça não permitindo um acesso igualitário, mantendo procedimentos complexos e não adequados e estruturados para as crianças, a par da sua caraterização, enquanto sujeito jurídico assente na menoridade, contribuem para a diminuição do seu estatuto legal e social, derivando daqui uma incapacidade para influenciar nas decisões, sejam elas numa dimensão jurídica como no âmbito das próprias decisões políticas e coletivas. Da conceção de criança enquanto sujeito ativo de direito(s) e da participação enquanto princípio, direito, processo, imperativo ético e questão política pretendeu-se: conhecer os modos e razões da participação das crianças nos processos tutelares cíveis a correr termos nas secções de família e menores; evidenciar como a justiça, nesta jurisdição, pensa a criança; caraterizar as vivências de participação das crianças; contribuir para repensar as políticas públicas; colaborar para a reflexão e para o debate em torno da cidadania da infância e do Direito das Crianças. A metodologia assume um enfoque interpretativo e diálogos interdisciplinares, cruzando os contributos da sociologia da infância e do direito. Atendendo aos objetivos, é manifesto um posicionamento ontológico marcado pelo carácter exploratório, descritivo e na ação; epistemologica mente, um posicionamento de natureza qualitativa e indutiva, procurando a compreensão detalhada, sistemática, em profundidade e contextualizada, operacionalizada em quatro cenários geográficos distintos - estudo de caso múltiplo empreendido nas comarcas de Braga, Bragança, Viana do Castelo e Vila Real. A história das vidas destas crianças, que estes processos judiciais contam, evidenciam o quanto são: monitorizadas, prescritas, escrutinadas e determinadas por técnicos, os quais não seguem práticas profissionais uniformizadoras; condescendentes e paternalistas no envolvimento da criança, onde ela é, por excelência, o centro do processo; se falha no seu reconhecimento, enquanto pessoa titular de direitos; se baseiam em práticas que atribuem primazia à proteção, como se a sua vivência no contexto familiar de litígio ou de perigo acontecesse numa redoma estéril, inócua e imune. Este espaço da justiça é reprodutor de preconceitos, perpetuador de uma cultura de não participação endémica e violador dos direitos das crianças, na medida em que não ouve, não escuta e não considera os contributos prestados por todas as crianças. O tempo, o(s) espaço(s) e o modo de comunicar com a criança são, também, sintomas e sintomáticos de uma atitude institucional que desvaloriza, afasta, desconsidera e não é amigável da criança. Este olhar multidirecional sobre os direitos da criança permite afirmar que é imperativo reconciliar a abordagem tradicional do direito com os novos paradigmas da infância, através do diálogo com outras áreas científicas, da formação profissional adequada, da incorporação da cultura da infância na cultura judicial, do reposicionamento que permita incluir as vozes das crianças, da consciência que este é um processo de aprendizagem em curso, inerente à própria construção da cidadania. É, neste sentido, urgente construir outro modus operandie elevar a justiça a uma particular altura - a das crianças. Superar o adultismo para que sejamos capazes de ouvir outras vozes; exigindo e demandando, num compromisso permanente, os adultos a se perceberem numa relação com as crianças, a qual está para além do mero desempenho de um qualquer papel institucional e de formalidades legais a cumprir, mas que assume sobretudo uma dimensão ética, a qual emerge da esfera individual e se dilui no processo de decisão coletiva., The chiid and childhood reconceptualization movement, certain newsworthy events, the new judicial organization, the specialization process, and a more friendly and sensitive justice reflect a renewed approach aiming to affirm an effectively and affectively discourse on children's rights and their capabilities - as presence, as affirmation, as competence, as autonomy. The child social construction image, the excessive protectionism, the rights conflict or even the costs have been obstacles in this assertion. Simultaneously justice spaces do not allow equal access, insist on keep complex, unsuitable and structured procedures for children, along with their characterization as rights subjects based on their underage, it endures contributing to their legal and social status decrease. Thus, resulting on their inability to influence decisions in a legal dimension or within political and coilective decislõns themseives. From the child conception as a right(s) active subject and from participation as a principie, a right, a process, an ethical imperative and a political question it was intended to: know the ways and reasons of children's participation in family courts judicial proceedings; highlight how justice, in this particular jurisdiction, thinks the child; characterize children's participation experiences; contribute to rethinking public policies; collaborate for reflection and debate on children citizenship and children's rights. The methodology assumes an interpretative approach and interdisciplinary dialogues, crossing contributions of childhood studies and law. Regarding the aims proposed, an ontological position marked by exploratory and descriptive charac ter and by action is clear; epistemologically, assumes a qualitative and inductive nature seeking for detailed, systematic, deeply and contextualized understanding, operationalized in four distinct geographical scenarios - a multiple case study was developed in Braga, Bragança, Viana do Castelo and Vila Real regions. These children's life history, which,these judicial proceedings tell us, highlight how much they are: checked, prescribed, scrutinized, and decided by technicians, the sarne who do not follow standardized professional practices; are condescendent and paternalistic about children involvement in court judicial proceedings, where he/she is at its centre; are incapable of recognize the child as a person hoiding rights; still base their practices on protection primacy as if the child's experience, in the family litigation context or in danger, occurs in a sterile, innocuous, and immune ambiance. It can be confirmed that this jurisdiction is a breeding ground of prejud ices, perpetuating a cuiture of non-participation that is endemic and violates children's rights - once does not listen and does not consider the contributions provided by ali children. Time, space, and way of communicating with the child are also symptomatic and a symptom of an institutional attltude that devalues, drives away, disregards, and is not child-friendly. The multidirectionai approach on chiidren's rights makes it possibie to affirm that it is imperative to reconcile traditionai law approach with new paradigms of chiidhood, through dialogue with other scientific areas, adequate vocationai training, incorporating chiidhood cuiture into judicial cuiture, repositioning in a way that aliows to include children's voices and be aware that this is an ongoing process, inherent to children citizenship construction. In this sense, it is urgent to buiid another modus aperand/and raise justice to a special height - children's height. Overcome aduitism, so that we can listen to other voices, and demanding aduits in a permanent commitment to perceive themselves in a reiationship with chiidren - which is beyond any institutionai role performance and legal formalities fulfiiment but assumes an ethical dimension that emerges from the individual sphere and is dilute in coilective decision-making.