Trabalho Final do Mestrado Integrado em Medicina apresentado à Faculdade de Medicina Introdução: A Hemorragia Digestiva Alta (HDA) é definida como uma hemorragia que ocorre no trato gastrointestinal superior, acima do ligamento de Treitz. A apresentação clínica pode ser evidente, com hematemeses e/ou melenas, ou o doente pode apresentar sinais subtis, como palidez ou anemia por carência de ferro. A Endoscopia Digestiva Alta (EDA) é o exame de eleição para identificar o local e a causa da hemorragia, podendo ser utilizada para a realização de procedimentos terapêuticos. Objetivo: Caracterizar os episódios de HDA, ocorridos numa população pediátrica do Hospital Pediátrico do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, num período de 10 anos. Materiais e Métodos: Estudo descritivo retrospetivo através da análise dos processos clínicos das crianças que apresentaram HDA (apresentação com hematemeses e/ou melenas), e que foram submetidas a EDA no episódio agudo, entre 1 de janeiro de 2008 e 31 de dezembro de 2017. Foram analisadas as seguintes variáveis: sexo, idade, apresentação clínica, dados analíticos, antecedentes pessoais e familiares, etiologia, achados endoscópicos e histológicos, tratamento e evolução. Análise estatística: SPSS (software IBM SPSS Statistics) 23®. Resultados: Cinquenta e cinco episódios cumpriram os critérios de inclusão, correspondendo a cinquenta crianças (62,0% do sexo masculino). Considerando os 55 episódios (amostra em estudo), a idade média foi 8,4 anos (mínimo 0,2; máximo 17,9). Na apresentação clínica, foram referidas hematemeses, melenas e as duas situações em simultâneo respetivamente em: 45,5%, 30,9% e 23,6%. Foi diagnosticada anemia em 63,6% dos casos (em 10 foi necessária a transfusão de glóbulos vermelhos). As causas identificadas foram úlcera gastroduodenal (27,3%), gastrite erosiva/hemorrágica (21,8%), varizes esofágicas (18,2%), esofagite (16,4%), lesões traumáticas (3,6%), síndrome de Mallory-Weiss (1,8%), duodenite erosiva (1,8%), hemobilia (1,8%) e sarcoma de Kaposi gástrico (1,8%). Em 5,5%, não foi identificada a etiologia. No episódio de HDA, em 5,5% dos casos foi realizada terapêutica endoscópica (injeção de adrenalina: 2; banding de varizes: 1), sem complicações. A infeção por Helicobacter Pylori foi identificada em 16,4% dos casos (oito casos de úlcera duodenal e um de gastrite), erradicada com sucesso em todos os tratamentos realizados. Considerando a hemorragia por varizes esofágicas, o cavernoma da veia porta foi a causa mais frequente de hipertensão portal. A endoscopia de controlo foi efetuada em 50,9% dos casos (realizado banding de varizes em 2), sem complicações. A evolução foi favorável em todos os casos. Não foram reportados óbitos relacionados com o episódio de HDA. Conclusões: As causas de HDA no nosso estudo são semelhantes ao referido nos países desenvolvidos. A elevada percentagem de hemorragia por varizes pode ser explicada pelo facto deste estudo ter sido realizado num centro de referência para transplantação hepática em idade pediátrica. Apesar da HDA poder ter uma apresentação grave e ameaçadora da vida, todos os casos tiveram uma evolução favorável, sendo rara a implementação de medidas terapêuticas endoscópicas no episódio agudo. Introduction: Upper Gastrointestinal Bleeding (UGIB) is defined as bleeding in the gastrointestinal tract, proximal to the ligament of Treitz. Clinical presentation may be obvious, with hematemesis and/or melena, or the patient may have subtle findings of pallor and iron-deficiency anemia. Esophagogastroduodenoscopy (EGD) is an useful diagnostic and therapeutic tool. Objective: Characterization of UGIB episodes, occurred in a pediatric population, in a 10 year period. Methods: Descriptive retrospective study through the analysis of the clinical charts of children who presented UGIB (with hematemesis and/or melena), submitted to EGD at the acute episode, between 1st January 2008 and 31th December 2017. Analyzed variables: gender, age, clinical presentation, analytical data, past medical and family history, etiology, endoscopic and histologic findings, treatment and follow-up. Statistical analysis: SPSS (software IBM SPSS Statistics) 23®. Results: Fifty-five episodes met the inclusion criteria, corresponding to fifty children (62.0% male). Regarding the 55 episodes (study sample), the mean age was 8.4 years (minimum 0.2; maximum 17.9). Clinically, 45.5% presented with hematemesis, 30.9% with melena and 23.6% had both. Anemia was found in 63.6% of cases (red blood cells transfusion was performed in 10 cases). Identified causes were gastroduodenal ulcers (27.3%), erosive/hemorrhagic gastritis (21.8%), esophageal varices (18.2%), esophagitis (16.4%), traumatic lesions (3.6%), Mallory-Weiss syndrome tear (1.8%), erosive duodenitis (1.8%), hemobilia (1.8%) and gastric Kaposi’s sarcoma (1.8%). In 5.5% of total, the etiology was not identified. At the time of the acute episode, therapeutic endoscopy was performed in 5.5% of cases (adrenaline injection: 2; variceal banding: 1), without complications. Helicobacter Pylori infection was found in 16.4% of cases (gastroduodenal ulcers: 8, gastritis: 1) successfully eradicated in all performed treatment. Concerning esophageal varices, portal cavernoma was the most common cause of portal hypertension. Control EGD was performed in 50.9% of cases (therapeutic endoscopy in 2 children: variceal banding), without complications. Clinical follow-up was favorable in all cases. No obits were reported due to UGIB episodes. Conclusions: In our study, UGIB causes are similar to other developed countries. The high rate of esophageal varices can be explained by the fact that this study was performed in a referral center for pediatric liver transplant. Although UGIB can be severe and a life threatening condition, all cases had a favorable course, requiring little or no acute intervention.