CAPES O objetivo desta pesquisa é analisar as rupturas e continuidades do discurso político sobre saúde na África do Sul Pós-apartheid. O estudo é qualitativo e se fundamenta na teoria materialista do Estado, no materialismo histórico-geográfico e nos estudos críticos de discurso de matriz bakhtiniana. Para o tratamento e análise dos corpora documental e bibliográfico foram utilizados conceitos e estratégias oriundos da transdisciplinar análise crítica de discurso. O corpus documental é formado, principalmente, por discursos políticos sobre saúde formulados pelos consecutivos governos nacionais do African National Congress - ANC e pelo Departamento Nacional de Saúde, e materializados nos enunciados de políticas e programas nacionais de saúde publicados entre 1994 e 2015. Além disso, em concordância com a perspectiva bakhtiniana, que considera os discursos como cenários da luta de classes e “ideologias em movimento”, determinados pelo chamado referente discursivo, que equivale aos lugares de classe e poder dos sujeitos do discurso, foi realizada revisão da literatura em língua inglesa e em português sobre a História contemporânea do Estado e das políticas nacionais de Saúde do país que criou um sistema de capitalismo racial, baseado na ultra exploração da força de trabalho negra e na institucionalização do racismo por meio do Estado capitalista moderno, cujo exemplo mais extremo foi o regime do apartheid, iniciado em 1948, resultante do pacto entre a classe trabalhadora branca e a elite política afrikaner. Além de serem analisadas as principais transformações na concepção do Sistema Nacional de Saúde desde o processo de democratização, iniciada com as eleições gerais de 1994, que levaram o ANC ao poder, foram analisados o cenário, os sujeitos e as relações de poder envolvidos no processo de transição à democracia e as suas relações com a reprodução capitalista na África do Sul nas últimas duas décadas. A pesquisa identificou significativas rupturas na concepção e na organização do Sistema Nacional de Saúde. Dessa forma, quando comparado ao sistema fragmentado, biomédico, racialmente segregado, assistencialista, privatista, ineficiente e dependente de subsídios estatais, vigente desde o fim do período colonial, aprofundado pelo sistema de bem-estar social pigmentocrático do apartheid , o discurso político sobre o Sistema de Saúde Pós-apartheid indica a tentativa de transformações em direção ao enfrentamento das desigualdades sociais em saúde, por meio da reorganização sistêmica da Política Nacional de Saúde. Esta deveria funcionar como um sistema único, integrado e fundamentado em perspectivas de atenção primária em saúde, enfatizando a responsabilidade das diferentes esferas do Estado e dos distritos de saúde em prover serviços de maneira descentralizada, transformando a formação e os processos de trabalho em saúde. No entanto, mesmo com os avanços na cobertura e gratuidade dos serviços de saúde, sobretudo dos básicos, existem obstáculos estruturais à efetiva implantação do Sistema Nacional de Saúde. O principal é o compromisso do ANC em seguir diretrizes neoliberais ultra ortodoxas, legitimadas pela Constituição Nacional de 1996 e pelo programa de contrarreforma do Estado, o Growth, Employment and Redistribution (GEAR), o que aprofundou a mercantilização das políticas sociais e tornou o país mais desigual do que durante o apartheid. This research aims to analyze the ruptures and continuities of the political discourse on health in post-apartheid South Africa. The study is qualitative and based on the materialist theory of the State, on historical-geographical materialism and on discourse critical studies of Bakhtin's matrix discourse. For the treatment and analysis of documentary and bibliographic corpora, concepts and strategies from the transdisciplinary critical discourse analysis were applied. The documentary corpus is mainly comprised by political discourses on health formulated by the consecutive national governments of the African National Congress - ANC and the National Department of Health, and materialized in the statements of national health policies and programs published between 1994 and 2015. Moreover, in agreement with the Bakhtinian theoretical approach, which considers discourses as scenarios of the class struggle and "moving ideologies", determined by the so-called discursive referent, which is equivalent to the places of class and power of the subjects of discourse. Due this perspective, a literature review was carried out in English language and in Portuguese about the contemporary history of the State and the national health policies of the country that created a racial capitalism system, based on the ultra-exploitation of the black labor force and the institutionalization of racism through the modern capitalist state, whose the most extreme example was the apartheid regime, which began in 1948, resulting from the pact between the white working class and the Afrikaner political elite. In addition to analyzing the main transformations in the conception of the National Health System since the process of democratization, which began with the general elections of 1994, which brought the ANC to power, were analyzed the scenario, subjects and power relations involved in the transition process to democracy and its relations with capitalist reproduction in South Africa in the last two decades. The research identified significant ruptures in the conception and organization of the National Health System. Thus, when compared to the fragmented, biomedical centred, racially segregated, assistantialist, privative, inefficient and state subsidized system, in force since the end of the colonial system, by the apartheid system of social welfare, the political discourse on the Post-Apartheid Health System points out the attempt of transformations towards the confrontation of the social inequalities in health, through the systemic reorganization of the National Health Policy. This should function as a single, integrated and grounded system of primary health care perspectives, emphasizing the responsibility of different spheres of the state and health districts to provide services in a decentralized way, transforming health education and work processes. However, even with advances in coverage and free health services, especially basic ones, there are structural obstacles to the effective implementation of the National Health System. The main one is the commitment of the ANC to follow ultra-orthodox neoliberal guidelines, legitimized by the National Constitution of 1996, and by the state counterreformation program, Growth, Employment and Redistribution (GEAR), which deepened the commodification of social policies and made the country more unequal than during apartheid.