Vital, Larissa Sousa, Dias, Mariana de Paula, Santos, Jader José dos, Souza, Romana Marques de, Porto, Sofia Sturzeneker, Souza, Rafaela Ferreira de, Barros, Maria Clara Burmann de, and Colliat, Isabella de Paiva
Introdução: A Síndrome de Mirizzi (SM), descrita por Pablo Mirizzi, em 1948, é um exemplo de desordem que acomete a via biliar. Consiste na obstrução do ducto hepático comum ou do ducto colédoco desencadeada pela oclusão extrínseca por cálculo impactado no infundíbulo ou no ducto cístico, é uma complicação rara da litíase biliar. Os fatores de risco para a ocorrência de litíase biliar também estão associados à maior incidência de SM: idade avançada, anticoncepcionais orais, perdas abruptas de peso. Apresenta sintomatologia extremamente variável, variando de apresentações assintomáticas a icterícia, febre e dor em hipocôndrio direito. Aproximadamente um terço dos pacientes apresentam colecistite aguda ao diagnóstico da SM, e, raramente, pancreatite aguda. Pode-se verificar alterações laboratoriais como elevação sérica de fosfatase alcalina e de bilirrubina, e em pacientes com associação de colecistite aguda, colangite ou pancreatite, pode haver leucocitose. Csendes estabeleceu a classificação da Síndrome de Mirizzi em quatro tipos a depender da presença e da extensão da fístula colecistobiliar. O tipo I refere-se à compressão externa do ducto hepático comum, sem o desenvolvimento de fístula. O II representa uma fístula colecistobiliar, a qual envolve menos de 1/3 da circunferência do ducto biliar comum. O tipo III está relacionado a fístula colecistobiliar, com mais de 2/3 do diâmetro da circunferência do ducto hepático comum. O tipo IV é definido quando há destruição completa da parede do ducto biliar comum. E, por fim, o tipo V representa qualquer dos tipos anteriores, associados à fístula colecistoentérica, sendo classificado Va quando não há íleo biliar e Vb na presença de íleo biliar. É de extrema importância que se faça o diagnóstico pré-operatório para o planejamento seguro da cirurgia, entretanto, aproximadamente 0.05 a 4% dos diagnósticos são realizados durante a colecistectomia em pacientes portadores de colelitíase. Pode-se usar a ultrassonografia (US), a qual geralmente revela cálculos biliares e uma vesícula contraída, entretanto, o diagnóstico dessa síndrome é dificultado devido à proximidade do cístico e do ducto biliar comum. Já a Tomografia Computadorizada (TC) abdominal é capaz de determinar malignidade, mas a sensibilidade para o diagnóstico de SM é de 42%. A colangiopancreatografia por ressonância magnética (CPRM) é um método com maior sensibilidade para avaliação da SM, além de possibilitar a determinação da extensão da inflamação pericolecística e de auxiliar no diagnóstico diferencial dessa síndrome. A colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) pode ser utilizada para confirmar o diagnóstico de síndrome de Mirizzi e determinar se há fístula colecistobiliar. Quando há falha da CPRE ou quando o paciente não pode realizá-la, procede-se com a colangiografia trans-hepática percutânea (CPT). Além disso, a CPRE e a esfincterotomia possibilitam a descompressão biliar por implante de stent interno em pacientes com icterícia obstrutiva ou colangite. O tratamento é cirúrgico e visa alterar os fatores precipitantes da síndrome: a inflamação da vesícula biliar e o cálculo impactado. Este artigo visa discorrer acerca dos principais aspectos relacionados ao tratamento cirúrgico da Síndrome de Mirizzi e estabelecer o tratamento de acordo com a classificação da doença do paciente. Métodos: Para isso, foi realizada uma revisão integrativa da literatura vigente, com os descritores “Cálculos biliares x síndrome de Mirizzi” e “surgical treatment x Mirizzi syndrome”, a partir dos bancos de dados Pubmed, Scielo e Lilacs. Foram encontrados 2.093 artigos, dos quais 10 foram utilizados para embasamento teórico deste trabalho, todos com data de publicação posterior a 2008. Discussão: A SM é uma patologia de difícil diagnóstico, pois seu quadro clínico é pouco específico. O diagnóstico pré-operatório da SM é essencial para evitar lesões iatrogênicas da via biliar durante o tratamento intervencionista, entretanto, em menos de 50% dos casos o diagnóstico é feito previamente ao ato cirúrgico. As lesões iatrogênicas são comuns, pois o processo inflamatório das estruturas envolvidas leva a distorções da anatomia habitual e cria aderências dos órgãos adjacentes aos ductos biliares. Para minimizar a ocorrência dessas lesões é necessário não apenas o diagnóstico pré-cirúrgico, como também a escolha da melhor técnica operatória, definida de acordo com o tipo da doença. Na SM do tipo I é realizada a colecistectomia total ou subtotal por laparotomia ou videolaparoscopia. A via laparoscópica na SM é controversa, sendo restrita ao tipo I, em pacientes selecionados e por uma equipe altamente treinada. Já no tipo II faz-se colecistectomia total ou subtotal aberta e o remanescente da vesícula biliar é utilizado para cobrir o defeito. Por fim, nos tipos III e IV a correção é feita com desvio bilioentérico, por meio de uma hepaticojejunostomia em Y de Roux. Em todos os casos é aconselhável tentar realizar uma colecistectomia fundo-colo, entretanto, em caso de dificuldades devido à anatomia muito alterada, recomenda-se colecistectomia subtotal, extração de cálculos, com fechamento do remanescente da vesícula biliar e drenagem vizinha. Ademais, as terapias intervencionistas não cirúrgicas são uma opção e têm sido utilizadas com êxito por alguns profissionais, dentre elas, a retirada do cálculo impactado por visualização endoscópica ou litotripsia. Entretanto, ambos procedimentos possuem limitações: a endoscopia tem sua restrição técnica pela região de alcance do duodenoscópio ou colonoscópio e a litotripsia encontra dificuldade quando se tem a interposição de alças intestinais, dificultando a visualização da região obstruída pelo ultrassom. Por fim, a diminuição da qualidade de vida e o aumento da taxa de mortalidade estão relacionados com as complicações inerentes ao ato cirúrgico, por lesões iatrogênicas ou pelo diagnóstico e tratamento incorretos. São comuns a infecção do sítio cirúrgico, as fístulas e as estenoses biliares. Sendo assim, é fundamental conhecer a síndrome, bem como sua conduta terapêutica, para evitar que o paciente desenvolva alguma das complicações e para que ele melhore seu prognóstico. Conclusão: Portanto, o tratamento cirúrgico da Síndrome de Mirizzi requer habilidade e amplos conhecimentos das relações anatômicas na dissecção da via biliar para realizar a colecistectomia de modo seguro, evitando-se iatrogenia e complicações.