De acordo com a World Health Organization (WHO)(1), a obesidade infantil é um dos mais sérios problemas de saúde pública do século 21, sendo considerado global e afetando principalmente países de baixa e média rendas em áreas urbanas. A prevalência da doença tem aumentado de modo alarmante e, em 2010, o número de crianças menores de cinco anos com sobrepeso foi de mais de 42 milhões, sendo 35 milhões residentes em países em desenvolvimento. No Brasil, o aumento da obesidade é preocupante. O VIGITEL 2013(2) apresenta dados referentes à entrevista realizada com 45,4 mil brasileiros, residentes nas capitais e Distrito Federal (DF), onde 51% dessa população estava com excesso de peso e 17%, com obesidade. Em 2006, os números eram 43% e 11%. Além disso, de acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar – POF (2008- 2009)(3), realizada pelo IBGE, uma em cada três crianças brasileiras com idade entre 5 e 9 anos está com peso acima do recomendado pela WHO(1) e pelo Ministério da Saúde (MS). Entre os jovens de 10 a 19 anos, um em cada cinco apresenta excesso de peso. O problema já afeta 1/5 da população infantil e pode resultar em uma geração futura de obesos, pois crianças obesas se tornam adolescentes obesos e 80% destes chegam à vida adulta também com obesidade. Assim, essa geração de pequenos obesos pode ser vista como futuros hipertensos, diabéticos, com riscos renais, cardiovasculares e cerebrais aumentados. Todos esses fatores reforçam a obesidade infantil como um importante problema de saúde pública no momento em que finaliza o ciclo com indivíduos “sem saúde” e elevados custos para o sistema de saúde pública do país. O Brasil apresenta uma dupla carga de doenças com origem na alimentação, sendo observada a ocorrência de enfermidades causadas pela deficiência de micronutrientes específicos e crescente prevalência de obesidade entre os brasileiros(4). A alimentação inadequada e o sedentarismo têm sido destacados como as principais causas da obesidade infantil. Em uma avaliação sobre os alimentos mais ingeridos pelos brasileiros, foi encontrado que refrigerantes, refrescos, doces e salgados estão entre os 10 alimentos mais consumidos pelos adolescentes, entre os quais não aparecem frutas e vegetais. Esse padrão alimentar reflete os crescentes números de excesso de peso e obesidade nessa faixa etária(5). Este número da RBPS apresenta resultados(6) acerca dos hábitos alimentares de adolescentes obesos de escolas públicas e privadas da cidade de Fortaleza, mostrando que 56,3% não realizavam o café da manhã, 70% não faziam as refeições junto com a família, 56,9% consumiam refrigerantes mais de 3 vezes por semana e mais de 30% frequentavam fast-food. Corroborando com esses hábitos alimentares inadequados, quase 30% dos adolescentes entrevistados foram considerados sedentários ou insuficientemente ativos. Esses achados mostram evidentes fatores de risco para a manutenção da obesidade entre esses adolescentes e refletem os dados do VIGITEL (2013)(2), segundo os quais Fortaleza apresenta 17,5% da sua população adulta com diagnóstico de obesidade. A alimentação infantil é também coordenada pelos hábitos alimentares dos gestores da família. Assim sendo, os adultos brasileiros também fazem uso de refrigerantes e refrescos, mas apresentam entre os 10 alimentos mais consumidos a salada verde(5). Considerando a influência da alimentação dos pais sobre as escolhas das crianças, é fácil perceber que os hábitos alimentares dos pequenos brasileiros estão apoiados sobre os pilares das escolhas inadequadas dos pais. Dessa forma, qualquer intervenção que busque reverter a crescente incidência da obesidade infantil precisa ser trabalhada juntamente com os responsáveis pela aquisição do gênero alimentício: os pais ou responsáveis(7,8). Além da aquisição, o ambiente de realização da refeição, a mídia televisiva, que abrange a “massa” da população, e o ambiente escolar também precisam ser vistos como determinantes dos hábitos e escolhas alimentares dos pequenos infantes, portanto, locais certos para a ação de educação nutricional e incentivo à atividade física(9). Tem sido bem documentada a associação entre a obesidade na infância e sua permanência na adolescência e idade adulta, bem como o desenvolvimento de comorbidades ao longo da vida. Atualmente, as doenças cardiovasculares, diabetes e câncer respondem por 63% de todas as mortes no mundo. Sobrepeso e obesidade em crianças são o provável início da obesidade na idade adulta e também o início do desenvolvimento de doenças não transmissíveis como diabetes e doença cardiovascular. Sobrepeso e obesidade são doenças crônicas altamente preveníveis, mas a duração da obesidade é um fator de risco, independentemente do IMC na idade adulta(7,8). Existe risco aumentado em 2,5 de mortalidade a cada duas décadas de obesidade do indivíduo(7). Todas as comorbidades envolvidas com a presença da obesidade podem ter consequências que extrapolam o corpo do indivíduo e chegam à saúde coletiva no instante em que o obeso trata suas doenças crônicas no serviço público e, desse modo, “injeta” um custo adicional ao tratamento da doença. Assim, considerando os fatores ambientais, entre os quais, alimentação e atividade física, e também o papel do esclarecimento dos pais e da sociedade quanto às escolhas alimentares saudáveis, bem como todos os aspectos emocionais envolvidos com o ato de alimentar-se de uma criança, determinantes no aumento do peso, reforça-se a importância das políticas públicas que visem a prevenção da obesidade nessa faixa etária, a fim de minimizar as consequências epidemiológicas das doenças crônicas originárias dessa condição. Entretanto, é incoerente não falar dos prejuízos psicológicos que acompanham a criança e o adolescente obeso. Não se pode desvincular peso corporal e imagem corporal. Aos dois anos de idade, a imagem corporal da criança já está formada. Entretanto, aos 7 anos, a criança começa a ter noção das dimensões do seu corpo e a se importar com as modificações que acontecem nele. Nesse momento, por influência do grupo ao qual pertence ou deseja pertencer, sua relação com o alimento muda, sendo o ato de alimentar-se visto como uma forma de inserção(9). Assim, sensibilizada com esses questionamentos sobre a obesidade infantil, a RBPS apresenta, rotineiramente, artigos contendo investigações coerentes, a fim de que a prática alimentar seja firmada como garantia da manutenção da saúde e prevenção de doenças nessa fase de formação da personalidade, e incentiva a busca por intervenções sobre as escolhas alimentares saudáveis, que, obrigatoriamente, precisam ser reforçadas e apreendidas por todos que pensam em um futuro com menos obesos e mais crianças saudáveis.